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sábado, 23 de janeiro de 2010

A música e o mito










Orpheu


 As mitologias de quase todos os países do mundo possuem figuras de deuses e semideuses aos quais se atribuem milagrosas habilidades musicais. Nas lendas gregas a figura mais conhecida é a de Orpheu. O seu canto submetia os animais selvagens, detinha o curso das ondas, fazia dançar as árvores e rochas. Quando a sua esposa, Eurídice, morreu, ele desceu aos infernos, enfeitiçou as criaturas do mundo subterrâneo e conseguiu do próprio Plutão a liberdade temporária da sua mulher. A lenda de Orpheu é conhecida em todo o mundo. Existem orpheus gauleses, hindus e até havaianos. Nos mitos hindus, os cantores influenciam no crescimento das plantas, mudam o curso das estações, detêm o sol e fazem cair a chuva. Os mitos irlandeses falam por vezes de harpas milagrosas, e a própria gaita-de-foles era utilizada inicialmente como acompanhamento de rituais celtas.
  
 A corneta do herói Rolando possuía poderes mágicos, a de Huon de Bordéus fazia dançar os seus ouvintes e claro Pied, o flautista de Hamelin, detinha o poder sobre os ratos e as crianças. A Bíblia relata que os muros de Jericó sucumbiram quando os sacerdotes começaram a soprar as suas trompetes. Salomão foi levado à loucura pelos cantos de suas mulheres e os marinheiros gregos eram deslumbrados e arrastados pelo doce canto das sereias.
  Na Índia, as escalas musicais tinham sete sons – na realidade, sete notas com um sentido simbólico, tais como os sete céus, os sete planetas, os sete dias da semana. À música era atribuído um poder mágico e Krishna era comparável a Orpheu.
  
  Sri Swani Sivanada fala-nos do poder da música hindu.
  Sa – ri – ga – ma – pa – dha – na são as suas sete notas musicais.
  Para este mestre "a música derrete rochas…extasia, embala, dinamiza, eleva, inspira, fortalece, revigora, magnetiza…há música nos regatos que correm, no canto das crianças, em todas as coisas."

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Recomendação Literária - Eugénio de Andrade



Pequena elegia de setembro

Não sei como vieste,
mas deve haver um caminho
para regressar da morte.
Estás sentada no jardim,
as mãos no regaço cheias de doçura,
os olhos pousados nas últimas rosas
dos grandes e calmos dias de setembro.

Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?

Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.

Com que palavras
ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?

Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim.


Os amantes sem dinheiro


Tinham o rosto aberto a quem passava
Tinham lendas e mitos
e frio no coração.
Tinham jardins onde a lua passeava
de mãos dadas com a água
e um anjo de pedra por irmão.
Tinha como toda a gente
o milagre de cada dia
escorrendo pelos telhados;
e olhos de oiro
onde ardiam
os sonhos mais tresmalhados.

Tinham fome e sede como os bichos,
e silêncio
à roda dos seus passos,
mas a cada gesto que faziam
um pássaro nascia dos seus dedos
e deslumbrado penetrava nos espaços.



EUGÉNIO DE ANDRADE