Nasceu o piolho, num choro de raiva, entregue por si às mãos firmes que o seguravam bem alto.
Voz da feroz alva chorou também por todos os desprotegidos.
Ácaros e piolhos também são filhos de gente. Um bem haja a eles por isso mesmo.
Para todos esses filhos e filhas do desconhecido.
Que urgem desesperados em serem alguém neste jardim à beira-mar plantado.
Pois nunca haverá uma meia poesia que nos despeça dessa nossa burguesia e todos os seus edénicos privilégios.
Admirando sempre a beleza inimitável, que age entre todos os actos de escolha.
Os actos que nos levam a ser alguém. Sem pressas nem idade.
Crescer nesta sociedade é como crescer numa masmorra.
Em nome da vida apenas e só. Vamos almejar silêncios de cristal ao sabor dos licores.
Retribuir como selvagens para a noite dos corpos. E dancemos. Dancemos como ávidos predadores uma vez mais.
Fomos formatados à nascença, de tal forma, que não conseguimos mais sequer aceitar o facto de que sugaram nos a alma por completo.
Na febre de sangue e pavor, exigem nos depois ser alguém mas não valorizam o individualismo nem o individuo.
A alma não é mais pertença nossa.
E quando a alma não chega, os sodomitas rastejantes saem dos seus buracos, esfomeados, para procurarem os restos dos corpos esquecidos.
Julgava eu ter já visto tudo, forjado na guerra, qual Aquiles invencível em mil batalhas.
Julgava finalmente ter redescoberto aquela voz que nos reconduziria à eficácia de existir, à sageza, pronto-socorro de um estado de espírito inigualável.
No entanto, prometi a mim mesmo que não voltaria a atentar contra a vida.
Almofariz de uma estrela, esse corpo porta em si a alma de um piolho com dignidade.
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