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sábado, 20 de junho de 2015

histórias sem história (o piolho)

Nasceu o piolho, num choro de raiva entregue por si às mãos firmes que o seguravam bem alto. 
Voz da feroz alva chorou também por todos os desprotegidos. 
Ácaros e piolhos também são filhos de gente. Um bem-haja a eles por isso mesmo. 
Para todos esses filhos e filhas do desconhecido.
Que urgem desesperados em serem alguém neste jardim à beira-mar plantado.
Pois nunca haverá uma meia poesia que nos despeça dessa nossa burguesia e todos os seus edénicos privilégios. 
Admirarás no entanto sempre a beleza entre todos os actos de escolha. 
Ser alguém. Sem pressas nem idade. 
Crescer nesta sociedade é como crescer numa masmorra. 
Em nome da vida apenas e só. Vamos almejar os silêncios de cristal ao sabor dos licores.
Vamos retribuir como selvagens para a noite dos corpos. E dancemos. Dancemos como ávidos predadores entre rodopiantes céus estrelados.
Fomos formatados à nascença para sugarem nos a alma por completo. 
Na febre de sangue e pavor, exigem nos para sermos alguém mas não valorizam o individualismo nem o individuo. 
A alma não é mais pertença nossa.
E quando a alma não chega os sodomitas rastejantes saem dos seus buracos para procurarem os restos entre os corpos esquecidos.
Julgava ter já visto tudo aqui, forjado na guerra, qual Aquiles invencível em mil batalhas. 
Julgava ter redescoberto aquela voz que nos reconduziria à eficácia de existir, à sageza, pronto-socorro de um estado de espírito inigualável.
No entanto prometi a mim mesmo que não voltaria a atentar contra a vida. 
Almofariz de uma estrela, esse corpo porta em si a alma de um piolho com dignidade.






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